sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Sozinha e debaixo de terra!


As palpitações vão aumentando a cada diz que passa. A respiração é ofegante e o estado de sufoco é constante. Mal me consigo manter de pé porque a força que tenho nas pernas é mínima. As dores de cabeça são constantes e a barriga não para de fazer barulho. Sinto que já nada está bem comigo. As minhas sensações são estranhas e as minhas emoções não ajudam em nada. Aquele sentimento de felicidade que existia em mim desapareceu de um momento para o outro e uma nuvem estranha cobriu o meu céu que um dia, no passado, se preencheu pelo sol. Hoje, não consigo avistar claridade alguma lá fora e são precisamente 11:00h da manhã. Porque é que será que tudo isto me acontece ao mesmo tempo? Porque é que será que o Sol não me ilumina o dia no mesmo momento em que todas as minhas cicatrizes se abrem. O escuro que está lá fora parece que condiz com a tristeza que se vive aqui dentro. Tudo o que me animava desapareceu e eu acreditava piamente que as minhas feridas tinham sarado. Mas não! O Sol não nasceu e com ele morreu a minha alegria. A minha vontade de lutar varreu'se da minha lista de desejos e agora a única coisa que lá pára é a esperança de um dia todo este nojento corpo voltar ao que um dia foi. Graças a ele o espelho tornou'se o meu pior inimigo e foi graças a ele também que as gotinhas de sal passaram a deixar o meu rosto cada vez mais limpo por escorrerem constantemente por ele abaixo. Hoje, digo que me sinto de novo debaixo daquela imensa terra e dentro daquela urna. Mas agora com uma diferença. Agora estou sozinha! Agora deixei de ter a companhia dos outros cadáveres e nem percebo o porquê mas sei que assim o meu sofrimento aumenta e a minha vontade de torturar'me e culpar'me por tudo e mais alguma coisa é enorme.
Sozinha e debaixo de terra! Sozinha e sem um único motivo para pensar que valeu a pena!

terça-feira, 7 de outubro de 2008

O meu féretro!


Hoje vejo o quando inútil sou. Vejo que as outras pessoas não sentem a minha falta e pouco se importam com a aparência da minha lápide. Hoje... Hoje vejo que a chuva foi bem mais forte do que qualquer acto de coragem ou sentimento de amor. A água que caía dos céus alagava o meu esquife e todos os outros que me rodeavam. Mas hoje, como sempre, eu não tive a sorte que os outros defuntos tiveram. Enquanto que os seus familiares lhes foram limpar a pedra que os cobre e sugar, com um farrapo velho, a água que se ia infiltrando eu fiquei ali no meio de todo aquele lamaçal. A manhã e boa parte da tarde foram passadas num constrangimento inexplicável. Foi como morrer uma segunda vez. Mas desta vez morri afogada na água que já tinha molhado aqueles que me diziam amar. A água que um dia me fez sorrir e me fez sentir a pessoa mais importante do mundo e que agora me matava. Os cortes que cobriam o meu corpo encheram'se de terra e, ao mesmo tempo, iam'se misturando com o pouco sangue que ainda existia. Os bichinhos agradeceram porque não tiveram melhor manjar do que o de hoje. A certa altura a chuva parou de cair e a água deixou de me cobrir. O sol foi desvendando o céu e uma frincha de luz entrou pelo meu féretro. Ao olhar para o meu corpo reparei que metade dos meus ossos já estavam descobertos. A carne que os revestia tinha sido arrancada com os dentes afiados de todos aqueles animaizinhos. As forças eram minímas e eu só queria permanecer na escuridão pra não ferir mais a vista. Não sei quem e muito menos o porquê, mas agradeço a quem fez questão de deitar um pouco mais de terra para a minha cova. Agradeço porque acabou com grande parte do meu sofrimento e com aquele sentimento de invalidade. Confesso que aqui em baixo, apesar de morta e incapacitada, a alegria sentida é muito maior do que quando percorria os caminhos quando estava viva. Afinal, estava viva por fora mas completamente destruída por dentro. De que é que me valia continuar a passear no mundo dos mortais se posso descansar em paz no mundo dos imortais?!...