domingo, 31 de agosto de 2008

O nosso momento!




O sorriso desenhavasse naturalmente no meu rosto e as nossas mãos uniam'se com o maior dos amores. Tocavas'me suavemente e eu sentia'me importantíssima para ti. Quando as gotinhas de sal escorriam pela minha cara tu lambias'mas e dizias para enfrentar todos aqueles problemas. Dizias que estavas ao meu lado e que era a tua menina. Lembro'me perfeitamente de tocares no meu corpo e perguntares porque tinha todos estes golpes, todas estas cicatrizes e todos estes ferimentos. Disse'te apenas que eram coisas da vida mas que agora iam passar. Os segundos iam sendo marcados pelo tic-tac do relógio que estava pendurado ao fundo da sala e tu ias sentindo todo o meu corpo ao seu som. À medida que o percorrias fazias força para que o sangue não escorre'se e não sujasse o sofá e, ao mesmo tempo, dizias'me ao ouvido que ias curar todos aqueles golpes. Agora? Agora olho para mim e ainda tenho as marcas das tuas unhas cravadas na minha pele. Aquele nosso último momento quase que era o meu último momento. De repente, deixaste de querer limpar'me as lágrimas salgadas e começaste a morder'me como se eu fosse um naco de carne que comes ao jantar. Não quiseste mais lamber as minhas gotinhas de sal com a tua língua e preferiste marcar os teus dentes no meu corpo. Talvez fosse mais um dos tantos aperitivos que tens, mas acredita que todas estas marcas foram sentidas como únicas. Quando acabaste, olhaste para mim como da primeira vez. Viraste costas e quando voltaste trouxeste uma bacia com água e um pano. Foste'me lavando e o sangue que me cobria ia sendo limpo. Sentia um suave perfume que me enchia a alma. No fim, limpaste'me o corpo e escovaste'me os cabelos. Colocaste em cima de mim uma manta suave que cheirava a bebé e deste'me um beijo na testa. Voltaste as costas e apagaste a luz. Depois?... Depois naquele vazio da escuridão disseste:
"Meu amor, só quero que morras bonita".

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O teu ritual!


Ultimamente, pergunto'me o que ando aqui a fazer. Por onde passo deixo um rasto de sangue e anseio pelo dia em que vou cair no chão e assim ficar para sempre. Deliro com a hipótese de ficar todos os dias ao teu lado como nos velhos tempos. Poder ouvir, novamente, todas aquelas histórias que contavas à mesa com a maior das satisfações, bem como aprender aqueles truques que fazias com as cartas. Sinceramente, tenho vontade de ir à tua beira outra vez mas sei que aquelas gotinhas de sal vão escorrer pela minha cara ensanguentada e o senhor perguntar'me'á o que estou a fazer em cima da tua sepultura. A única coisa que vou conseguir dizer'lhe é para me deixar sozinha e o vento lamber'me'á as lágrimas do rosto. Ao vir'me embora terei vontade de ficar mais tempo contigo só que o dia começará a escurecer e as almas que nos rodeiam, bem como a tua, sentar'se'ão em cima das suas campas, como fazem todas as noites, para orarem pelos seus mortais. Terei que vir para casa porque não poderei participar nesse vosso ritual mas um dia espreitarei e verei como vocês fazem. Sei que não será correcto mas tu perdoas e és o único que preciso que me perdoe.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

O teu Acto de Glória!


Mesmo sentado ao meu lado não és capaz de enfrentar'me. Será que te meto assim tanto nojo para não seres capaz de tocar'me e de me olhar nos olhos? Mas quem diria que ficarias assim. Lembraste quando compravas compressas e eosina para curar as minhas feridas e ias metendo as tuas mãos em cima do meu corpo coberto de sangue para me minimizar as dores? Lembras?! Agora não és capaz de me sentir através de gestos de bondade nem de carinho, mas quem te dera tocar'me para me bater. Sim meu querido! Vejo nesses olhos todo o rancor e ódio que estás a sentir por mim nestes instantes. Mas estás à vontade, aliás, sempre estiveste. Podes bater, podes matar, podes fazer o que quiseres. Sempre estive ao teu dispor para te dar uma segunda oportunidade e para ouvir todas as tuas desculpas. Fazia isso porque te amava de verdade e a única coisa que queria era ter'te ao meu lado todos os dias. Mas de que é que me adiantou todo o esforço e sofrimento? De nada! Continuas a fazer'me sofrer e eu não te tenho comigo. Por isso, estás à vontade! Ninguém te vai interpelar para saber os motivos pelos quais me mataste. Ninguém te perguntará porque todos sabem o que se passou. Agora, agora meu amor faz o que tens a fazer e no fim... No fim do teu serviço e acto de glória terás entre as tuas unhas pedaços da minha carne, a tua cara estará salpicada com o meu sangue e cuspirás em cima de mim como se fosses um héroi... Eu? Eu desejar'te'ei apenas as maiores felicidades do mundo.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Pelo menos morri feliz!


Quando olhei uma última vez para ti vi que estavas a sorrir. Não sei se o fazias por estares contente ou se porque estavas nervoso. Sinceramente, agora não me preocupo minimamente com isso. Fiquei com uma última lembrança tua e se me perguntares se a queria, eu dir'te'ei que não. Preferia mil vezes que enquanto me degolasses me vendasses os olhos para que eu não tivesse que ver o teu rosto suado da força que tiveste que fazer para me prender nem a tua cara de satisfação. Sim! O sorriso que desenhaste no teu rosto era de alegria e contentamento. Ficaste extremamente feliz por me veres morrer ali naquele soalho que depois ficou coberto com o meu sangue mas ficaste mais satisfeito ainda por eu não te ter dado tanta luta assim. Mas meu querido, fizeste aquilo que mais desejavas em toda a tua vida e agora? Agora meu querido? Diz'me do que agora vais viver? Será que há alguém que te deixe alimentar das suas próprias fridas e te dê a beber o seu próprio sangue? Duvido... E sabes porque duvido? Porque tu és pior do que aqueles carniceiros que vão apodrecendo por dentro a cada dia que passa mas que não se querem convencer disso. Sim, tu estás podre por dentro. Não tens absolutamente nada e eu não tenho pena de ti. Mas mesmo assim, desejo'te metade do que aquilo que desejaste a mim. Não quero que sintas a mesma alegria que eu quando te vi morrer por dentro sem teres ninguém ao teu lado para te ajudar e apoiar... Morreste sozinho enquanto que eu morri acompanhada por ti.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Este miserável planeta!


Aquela impressão de que sou nada e de que nada valho persegue'me. Não sei qual é que é a sua finalidade mas acho que a cada dia que passa habituo'me a ela. Não sei explicar o porquê disto acontecer, apenas sei que interiorizo minimamente aquilo que me rodeia. Já nada mais me espanta. Pessoas que se matam e matam por amor era algo que me transtornava mas, agora, não posso dizer o mesmo porque já muitos o fazem e, por isso mesmo, já não me espanta. Pessoas suicídas impressionavam'me pela coragem que tinham para o fazer mas sei que o faziam e fazem apenas porque pensam que vão para uma vida melhor. Aquelas guerras nojentas e sem qualquer tipo de lógica metiam'me uma certa impressão, mas agora penso que se o fazem é porque querem mostrar quem é o mais forte entre duas pessoas, duas comunidades, dois países, etc... Mas ao que ainda não me habituei e nem me quero habituar é ao saber que neste momento... Neste momento em que escrevo estas palavras no aconchego da minha casa, há em outras partes deste miserável planeta crianças a morrerem à fome. Podem'me dizer tudo e mais alguma coisa, mas a minha opinião e a minha crença não mudam. Sei que não imagino o que elas sofrem assim como metade do mundo, mas ao ver certas imagens e certos vídeos sinto'me um estupor de pessoa. Estupor por, por vezes, desperdiçar e rejeitar aquilo que aquelas criancinhas mais precisam para viver.

domingo, 3 de agosto de 2008

Debaixo deles!


Sim, até já gosto. Acredita que gosto. Habituei'me de tal maneira a este ambiente ofegante que agora pouco me importa se o ar me está a faltar ou se não tenho espaço para me mexer. Este esquife passou a ser simpático comigo apesar de já estar a apodrecer. As rendinhas que estão à minha volta também me enfeitaram no dia do meu velório para que eu pudesse ir minimamente bonita. Sim! Nunca poderia ir completamente deslumbrante porque nunca o fui, mas a verdade é que naquele dia, no dia no meu funeral, senti'me importante. Não por ter montes de pessoas que foram cumprimentar os meus pais e os meus familiares mas sim por saber que os meus amigos verdadeiros estiveram lá. Que deixaram cair lágrimas de tristeza e não aquelas lágrimas de crocodilo que são momentâneas. Agora, aqui debaixo sinto tudo o que eles vivem lá em cima. Os meus sentimentos e a minha sensibilidade, por incrível que pareça, vieram comigo. Continuo a sentir as coisas da mesma forma apenas com uma pequena diferença. Antes, podia fazer tudo para conseguir alcançar aquilo que mais desejava; agora, limito'me a ver as coisas acontecerem e aceitar isso mesmo sem ter a honra de opinar.